Ex-votos são visões de corpos duros, retalhados sem dor.
São peças de um quebra-cabeça santo, partes de um corpo que, ao ser entregues na Casa de orações, nos deixam de pertencer e que mesmo assim ainda nos pertencem.
São como o par de luvas que despimos: portadoras aparentemente ocas dos membros ausentes, guardiãs de mémorias de pele, forma e calor.
Pede-se pela perna, enquanto que se oferta a mesma perna – entalhada na madeira pela faca. Se entrega anonimamente o seio, o dorso, a mão, o pé e mil vezes o coração arrebentado.
Ex-votos são mil, são cem mil, são cada vez mais ex-votos, não cabem numa sala só.
Aglomeram-se, se abraçam, se acotovelam. Não doem os ex-votos, dói só o corpo todo e seu desconsolo.
A multidão de ex-votos não marcha, somente espera na poeira, enquanto que os de-votos sobem a ladeira sob a chuva rala.
Texto: Yili
quarta-feira, 15 de abril de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário